23/07/2010

Prazo de Validade

Tudo tem um prazo de validade. A vida tem sempre um ponto (pode ser de exclamação, mas acaba sempre num ponto, final) A questão é não sabermos qual é o prazo de validade da vida. Há estimativas estatísticas: um homem português vive em média 75 anos e uma mulher 80. OK. Mas de qualquer modo não é um prazo visível, não há uma data marcada no calendário. Por vezes entretinha-me a ver quando tinham morrido pessoas nascidas em 88 de outros séculos. Por exemplo Fernando Pessoa nasceu em 1888 e morreu em 1935. Um jovem, se pensarmos bem nisso. E não me estou a ver a morrer em 2035, com apenas 47 anos. Portanto devo morrer lá para os anos 60; 80 anos de vida parece-me suficientemente bom... Bom, esperemos que a vida não me pregue uma partida, e azede antes do prazo.

Ora, com estimativas ou sem elas, o importante é que vivemos a vida sem ponto final à vista, vamos de vírgula em vírgula, pontos de interrogações e parêntisis. Até que o ponto derradeiro chega, inesperadamente. Mesmo que tudo indique que se trata já da conclusão da vida, o ponto final chegará sempre de surpresa, pondo um ponto final na vida. Ponto.
Vivemos sempre com uma bruma à nossa frente, sem saber o que o futuro nos aguarda, que parágrafos se seguem, que capítulos se encerrarão e que outros se abrirão. Planeamos, sonhamos, mas apenas podemos viver verdadeiramente o momento, o presente, o quotidiano. Esta sucessão de dias vai trazendo alterações à narrativa que é a vida e encaminhando-a, enformando-a. Mas nós vivemos envoltos nessa ideia de um prazo num plano infinito. O final está sempre em aberto, nunca se sabe quando chegará, nem como.

Ainda bem. Seja o fim uma surpresa.

No entanto, este ano que passou foi um ano a prazo. Vim para Berlim, em setembro sabendo que no verão iria voltar para Lisboa. Nos primeiros meses, essa data, esse prazo de validade da minha vida berlinense era longínquo, intangível. E assim vivia pacificamente. Talvez não me ocupasse tanto por não pensar no prazo que chegaria. Haveria tempo depois. (não deixes para amanhã o que podes fazer hoje, que irritação a sabedoria popular)
Enfim, agora, a pouco mais de uma semana do ponto final em Berlim, sinto-me como um condenado à morte (dos poucos seres do mundo que sabem verdadeiramente o seu prazo de validade). Aproximo-me inexoravelmente do ponto final. Não há volta a dar à pontuação. É um ponto. Mesmo que seja um ponto-e-vírgula, o seu significado é o de um ponto. Encerra-se um ano. Não tem continuidade com os próximos, não se confudirá. Venha Berlim a receber-me de novo será um parágrafo, travessão, novo diálogo.
Saber que há um prazo coloca uma enorme pressão nas coisas mundanas. O último domingo, o último passeio de bicicleta, o último encontro, o último despertar em Berlim. Existir um prazo de validade pode ser triste. É-o de facto. É pena as coisas boas acabarem sempre (as más também, pelo menos isso). Mas saber de um prazo faz-nos querer que cada momento seja especial, consumir de preferência antes de... Assim é. E assim não vale a pena deprimir por o dia não ter sido especialmente especial, bastam pequenos pormenores para o enriquecerem. Hoje é a chuva, um filme e um trabalho por fazer. Nada de especial. Mas bom e simples. Simplesmente bom.

Prazo de validade há sempre. E sabendo, vivemos mais intensamente, mas também mais pesadamente, mais nervosos por sabermos que estamos a viver os últimos momentos antes do ponto final. Ignorando o prazo vivemos o presente, projectando-nos no futuro e pensando que haverá tempo depois. Não há. Então vivamos intensamente o presente, mas sem grandes preocupações. O ponto final chegará. Ao menos estejamos felizes quando ele chagar e pontuar a vida.

22/07/2010

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